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31 de março de 2009

Acerca do "simplex"...

Falar de desburocratizar é por vezes confundível com facilitar.
Para mim chega, é demais. E o melhor exemplo disso é o Governo que começou a “simplificar” tudo e mais alguma coisa.
Criou-se a falsa ilusão de que tudo é possível.
Importa assim perceber a quem querem eles facilitar e o quê.
Fica a pergunta. Quem souber que responda. Eu não sei.
P.A. uma provocação. É esta a tua deixa...

2 comentários:

PJA disse...

A simplificação administrativa é um mito, embora até pudesse ser feita por uma entidade que estivesse de boa-fé, o que não é o caso do Estado em que vivemos. Remeto, por isso, para o artigo de F. do Valle, no SEMANÁRIO, que transcrevo:

"Morrer SIMPLEX

Diz-se que o português é triste, pessimista e dado à maledicência, por razões provavelmente antropológicas, e que culpa invariàvelmente o Estado de um destino que lhe parece fadado para a desgraça e a frustração. Diz-se que é negativo e conformista. Que não compreende tudo o que os seus governantes labutam diàriamente pelo seu bem estar.
Imaginemos, então, uma cidadã nascida e residente em algum lugarejo, por exemplo, em Trás-os-Montes. Chamemos-lhe Maria e suponhamos que tem 80 anos. Os dois filhos emigraram há muitos anos para a América e aquele que ainda vive só vem de muitos em muitos anos a Portugal. Desde que ficou viúva, nem tudo tem corrido bem, por culpa própria, pois, dada como é ao pessimismo tìpicamente português, nada tem feito para triunfar na vida e responder positivamente aos apelos entusiásticos dos governantes no sentido de modernizar as mentalidades e mudar comportamentos.
Não sabia, apesar dos esforços da diligente administração pública, que toda a sua situação fiscal se encontra na internet (nem sabe o que isso é, pasme-se!...) e que o defunto estava atrasado na declaração de IRS. Não consegue preencher, com a desculpa de que é analfabeta e mais o glaucoma, os impressos do imposto de selo e do IMI. Não faz ideia de como identificar os bens móveis e imóveis que tem, mais os do filho sobrevivo e os dos netos nascidos do outro filho, nem entende o que é de quem tendo em conta o regime de bens em que se casara. Fica apática quando um vizinho lhe diz que tem de apresentar licenças de construção e de utilização e certidões prediais nas finanças. Não faz habilitação de herdeiros, mesmo quando lhe dizem que é necessária. Não entende porque lhe escrevem cartas com coimas por irregularidades diversas que cometeu por não tratar de todas aquelas coisas que não entende, porque não atribui significado às palavras constantes das notificações, como, aliás, não atribui a nenhuma das outras palavras que, sem que soubesse, eram tão importantes na sua nova vida de viúva, com 80 anos, quase cega. Maria não imagina, sequer, que tipo de deveres tem, pois a sua debilitada memória vagueia pelo tempo em que a Casa do Povo e a Estação dos Correios eram o único sinal de um país para lá da aldeia.
O seu pessimismo leva-a, portanto, a não dar valor a expressões como “velhos são os trapos”, o que demonstra, à saciedade, que pertence a uma geração derrotada e distante dos benefícios da modernidade.
Num belo dia, entra-lhe em casa a justa penhora que, como é próprio de uma sociedade democrática, se aplica a todos os contribuintes incumpridores, sem distinção de sexo, idade, condição social ou lugar de nascimento. “Dura lex, sed lex”.
Maria ficará desamparada por perder a casa, a courela, as ovelhas? Não! O Estado reserva-lhe, sem dúvida, algum lar da Segurança Social para que tenha tecto e sopa. Ou talvez não reserve, mas a culpa foi dela que tentou fugir aos seus deveres de cidadã. O que esperava? E o filho que está na América, não podia ter dado uma ajuda? Não sabia o que estava a acontecer?!?... Não emigrasse...
Maria não pertence a uma minoria étnica, nem a um bairro problemático. Não pode trocar a barraca por uma casa, pois nunca roubou ou invadiu propriedade alheia e, por isso, não tem direito a uma discriminação social positiva. Maria não vota. Maria não paga. Maria vale menos do que o chocalho distante no pasto morno de Agosto.
Maria de Trás-os-Montes (mas bem pode ser de Lisboa, das Beiras ou do Alentejo) obriga o Estado a muito esforço e em nada contribui para o progresso desta sociedade integrada na Europa dos 27. Ela, Maria, representa bem o português pessimista, derrotista, que culpa o destino ou o Governo, em vez de olhar para as suas próprias incapacidades.
Maria não sabe quem são os gestores ilustres, os futebolistas ilustres, os modelos ilustres, os políticos ilustres, os presidiários ilustres, mais todos os ilustres que são todos os que os jornalistas ilustres quiserem que sejam. Mas chora com a saudade dos netos que já não poderá abraçar.
Maria nunca teve o Cartão Único, verdadeiro símbolo distintivo de uma cidadania responsável!
Às tantas, é capaz de morrer, sem morte assistida, só para dar uma trabalheira...

F. do Valle
fernandesdovalle@gmail.com
F. do Valle é português, anarquista e não tem currículo"

Pingos e Salpicos disse...

mais do que adorar fazer provocações gosto especialmente das respostas e das reacções. Valle, estás muito bem!! E a malta gosta de ter por cá gente com opiniões!